Fotos da autora Certifico e dou fé que, em busca de cumprir a ordem do Meritíssimo Juiz de direito desta Comarca, acatadas as formalidades legais passíveis de serem cumpridas, devolvo o presente mandado sem cumprimento. Isso porque citar o destinatário é impossível, por conta de ele residir em endereço inacessível a este Oficial de Justiça ou a qualquer outro que venha, porventura, me substituir. O remetente deste mandado vive em residência acessível apenas por via fluvial, sendo necessário o deslocamento em embarcação alugada com percurso de dois dias para ir e outros dois para voltar, com pernoite no local e, ainda, com o agravante de a missão representar risco à integridade deste Oficial, em especial, em época de chuva, quando os rios atingem níveis elevados.
Caro leitor, você não está lendo um mandado verdadeiro, claro que, grosso modo, eu tentei reproduzir um, com a finalidade de tocar num ponto crucial aos moradores da Amazônia: o acesso.
Falar sobre o Norte do país e, por conseguinte, sobre a Floresta Amazônica, com olhos voltados à necessidade ambiental é o mais comum. No entanto, os povos da floresta se deparam com um viver custoso que, para muitos, é impensável.
O Brasil, país continental, de extensão e diversidade infindas, garante a todos os seus habitantes, incluindo-se os estrangeiros aqui residentes, o direito ao acesso. Acesso à quê? À saúde, à segurança, à igualdade, à liberdade, à vida, esses são, pois, os direitos fundamentais, que podem ser acrescidos de outro, educação. Colocar em prática de forma efetiva esses direitos, no entanto, é missão quase impossível. Se entregar a alguém citado em um processo uma certidão é difícil, imagine, você, como será o acesso a qualquer um desses direitos. E estudar para além da educação básica, há essa possibilidade?
Rio e mais rio, mata fechada, falta de comunicação, deslocamento precário ou até inexistente, ausência de transporte regular, ausência de internet e, em alguns pontos, de telefone são exemplos de situações que não permitem às pessoas que residem em lugares longínquos serem encontradas. Há cidades inteiras assim no Acre - Porto Walter, Marechal Taumaturgo, Santa Rosa do Purus - e no Amazonas - Tabatinga, Benjamin Constant e outros municípios do Alto Solimões.
Ao pensar na floresta, não fixe seu pensamento apenas em questões ambientais, amplie sua visão e reflita sobre as dificuldades tantas por que passam os povos que lá residem e lembre-se de que os direitos, às vezes, não são tão direitos, quando se torna mais utópico e menos real ter acesso a eles.