Frepik Um dia fui atenta ouvinte desta narrativa. Quem me contou estava mais em busca de reviver a sensação de falar sobre a mãe, àquela altura já ausente, do que relatar a história que, logo após ouvir, registrei em palavras e hoje publico. A questão é que, à medida que o tempo vai passando, mais sentimos a necessidade de reviver de algum forma as situações que tantas lembranças despertam. E assim, meu locutor, quando recebeu em texto escrito o relato oral que me havia feito, sinalizou que, quando eu quisesse, poderia passar adiante, porque em algum leitor poderiam ser despertados todos os sentimentos bons que, segundo ele, consegui registrar, de modo que aqui segue.
Conselho para guardar
Eu tinha 13 anos e um motivo de olhos e cabelos claros para ir à igreja naquela noite com minha mãe. Ela iria a uma reunião que aconteceria depois da missa. Chegamos, porém, cedo. A missa não havia acabado. Não íamos entrar na igreja. Minha mãe me convidou para um inusitado passeio. "Vamos dar a volta em torno da igreja. Faltam 20 minutos para o término da missa e esse será o tempo que vamos gastar para caminhar pelo quarteirão todo. E você ainda poderá ver a Roseli, saindo da igreja." Minha mãe era assim, sempre encontrava uma maneira de resolver qualquer situação. Eu poderia descrever muitas, mas aqui preciso contar do que aconteceu durante o percurso em torno da igreja. De braços dados, andávamos de braços dados, era tão bom andar com minha mãe, colada nela e atento ao que ela me dizia. E naquela noite distante no tempo e tão presente na minha memória, eu e ela começamos a caminhada. De repente, ela parou , me olhou e disse: "Eu vou te falar uma coisa, um dia eu não estarei mais aqui, e você vai lembrar desta noite, vai lembrar desta nossa caminhada e do que estou lhe falando e vou pedir que, também um dia, com o filho ou filha que tiver, venha exatamente aqui e dê essa mesma volta e repita tudo isso que está ouvindo." Minha mãe era simples, estudou pouco, mas conquistou um diploma raro, até mesmo entre os mais graduados: ela era doutora em sensibilidade para lidar com o ser humano e era precisa para dizer o que cada um necessita ouvir em determinados momentos da caminhada da vida. Hoje, quando não conto mais com a presença física dela, me dou conta da sabedoria da minha mãe para lidar com a vida. Enquanto escrevo este texto, revivo a passagem pelo quarteirão e ouço na minha memória a voz de minha mãe, que em minha lembrança viverá para sempre.