Foto da autora A moça chegou ao escritório e foi recebida pelo colega de trabalho com um alegre bom dia.
Bom dia para quem? Ela pensou na noite que tivera. Havia passado em claro. As preocupações cotidianas não a deixavam há dias descansar. Pensou nas horas e horas em que se virou na cama. Levantou, foi ao banheiro. Meia hora depois, levantou e tomou água. Mais meia hora e precisou novamente ir ao banheiro. Lembrou-se, então, da receita da vovó Olívia e foi para a cozinha. Dizia a avó que uma xícara de leite morno é tiro e queda para a insônia. E assim fez...Tomou o leite e foi se deitar.
Acordou na manhã seguinte com o despertador lhe avisando que era hora de ir para o trabalho. Dormiu poucas horas, não sabe se por causa do leite ou se por causa das lembranças que lhe vieram à mente. Lembranças da infância, da avó, de tempos em que a vida era feita de instantes duradouros de sorriso. O sabor adocicado do leite trouxe com ele o gosto da massinha de pão frita e passada no açúcar com canela, gosto da rabanada do meio da tarde feita com os pães que restaram da manhã, o macarrão do domingo, com o molho bem vermelhinho, acompanhado pelo frango caipira.
Antes de o sono vir tomar o lugar da insônia, a moça se lembrou ainda da voz da avó a avisá-la sobre as obrigações do dia, escola, tarefa, ajudar com os afazeres domésticos e, claro, não pôde deixar de pensar no quanto brincava. Correr, pular a amarelinha, pega-pega, esconde-esconde, balança-caixão, mãe da rua, salada de frutas. Meninos e meninas compartilhavam horas frenéticas de brincadeiras inocentes, de gritos que anunciavam pisadas na linha da amarelinha ou de céu e inferno, batidas no pique ‘um, dois, três, salvo eu’.
O colega de trabalho viu nos olhos da moça um ar de alegria e, como não havia tido resposta, mais uma vez disse bom dia. A resposta veio imediata. A moça olhou para ele e respondeu: ‘Bom dia!’ Naquele instante morreu dentro dela a tristeza, pensou no bolo de aniversário e na cereja em cima dele e disse: ‘que o dia nos faça sorrir, pois o sorriso é a cereja da vida’.