O jantar
Ela chegou ao restaurante e se sentou solitária em uma mesa no centro do salão. Usava um vestido vermelho, sandálias pretas, uma delicada bolsa preta de mão em couro. Os cabelos escuros contavam com uma parte presa por uma presilha de pérolas, compondo um harmonioso conjunto com o colar e os brincos também de pérolas. A boca era carmim, os olhos maquiados e bem contornados. A bochecha trazia um toque leve de um rubor provocado pelo blush.
O seu semblante era cansado. Os olhos denunciavam lágrimas insistentes, porém, aqueles olhos tinham um brilho que lhes era peculiar. As mãos de unhas escarlates eram delicadas e macias e ao olhar para elas, a mulher se lembrava há quanto tempo não sentia a segurança de outra mão na sua. Escolheu um prato leve, pediu vinho e não brindou, embora tenho levantado a taça para desejar a si mesma dias em que ela pudesse se sentir um ser humano melhor.
Ao passo que degustava o sabor do prato, sentiu-se observada. À sua esquerda, um solitário cavalheiro admirava-a com atenção. Ela se incomodou, sua privacidade fora invadida, mas ao mesmo tempo, um sentimento de alegria lhe tomou, porque gostou de saber que estava sendo observada.
Findado o jantar, fez menção ao garçom, pois desejava escolher uma sobremesa. Neste momento, o garçom lhe informou que haviam escolhido uma para ela. E trouxe então à mesa sem mencionar quem fora. Ainda que ela deduzisse ter sido o cavalheiro solitário, nada perguntou ao garçom, porém não recusou o doce que ele colocava à sua frente. O garçom entregou-lhe um pequeno bilhete, no qual ela leu: "Poucas são as pessoas de presença tão marcante como a sua. Me ligue, ansioso." Ao olhar para a mesa onde estava o cavalheiro, ele já se levantara, olhou para ela e deu um sorriso discreto e carinhoso.
Passou por detrás de sua mesa e tocou-lhe levemente o ombro. A mulher sequer provou da sobremesa, ficou ali a pensar e a imaginar quem seria aquele homem. Olhou tantas vezes ainda para o celular, pois aguardava uma mensagem para ela tão cara. Mas nao veio. Guardou em sua bolsa o pequeno bilhete e voltou para casa ainda mais sem rumo do que antes.
Parte final
(Osni Vidreiro)
Para falar a verdade, na mais tênue sensibilidade, ela não gostou tanto que ele lhe tocasse o ombro, embora soubesse, de há muito, que a fonte de toda e qualquer relação não suportaria mais do que trinta segundos em um olhar. Era assim. Ora se era!
O que estaria pensando aquele rapaz ao deixar o número do seu telefone? Não gostou da resposta imaginada. Lembrou de uma música que dizia " Pensando bem, eu não queria ter você por um programa, apenas ser mais um na sua cama, por uma noite apenas e nada mais...". E a moça de vermelho levantou-se, pegou a bolsa e saiu, deixando o tal bilhete com o número do telefone largado sobre a mesa com qualquer outra promessa ou possibilidade que não fosse tão pura e profundamente a de um olhar...